Deus, seu sorriso é uma janela para minha alegria. A noção exata de te sentir me faz tão feliz. Foi tão rápido que descobri o brilho de um astro, aquele que iria fazer de minha história um recomeço de amor. Houvram pedaços que se soltaram, e ficaram lá atrás, mas eu não esqueci. De certo modo estão colados na minha memória. Todos tiveram suas cores, alguns cinzas, craquelados, alegres, e outros coloridos demais.Em cada um deles eu vivi de coração. Eu ouvi o AMOR me chamar, ELE brincava comigo quando minha tristeza precisava de risos. Eu senti sua voz me ninar, quando eu chorava de frio e de fome. Adormeci muitas noites, imaginando um copo de leite, nem precisava ser quentinho e cheio, bastava matar minha fome. Muitas vezes não fazemos nada, e não há nada que se possa fazer com isso. Mas a minha direção era sempre iluminada pelo Sol. Por quê? Eu me fiz muito essa pergunta. Mas tratava de me fortalecer me dando a resposta positiva, que um dia tudo iria ser bem azul, e no fundo um arco-íris mandado pelo Céu, iria indicar a direção que eu precisava seguir. “Não chore Fernandinha, a gente um dia vai ter um pai e uma mãe, irmãos, um lar e você até vai poder comer empada no domingo”. Eu me dizia isso sempre que pensava não haver mais maneira de me dar força, por me sentia fraca de fome. Eu olho para trás e sinto um orgulho tão grande de mim, é sério! Eu sinto. Quando recordo aquele tempo, meus olhos mergulham num mar de emoções. Como fui corajosa diante das noites em bancos de praças. Mas eu não sabia o que era perigo até eu ficar grandinha. No entanto tudo já vem bem detalhado, e com um cuidado excessivo do Criador. Nenhuma criança fica desamparada a seus olhos. Ontem eu vi do ônibus, um menino de rua caído com um saco de cola nas mãos, aquilo me doeu inteira. Pedi que o Senhor colocasse alguém em seu caminho ali, para ajudá-lo a sair daquilo. Precisamos conscientizar nossas crianças, de que as drogas são bichos papão desde cedinho, para que elas não tenham a curiosidade de experimentar. Orientar estas crianças de que não devem aceitar balas ou qualquer outro presente de estranhos, porque existem muitas pessoas mal intencionadas por aí. É incrível como a confiança perdeu o sentido no mundo. E o mal tomou conta de corações por opção de quem os carrega. Comecei falando de amor e me estendi para outro rumo, que não deixa de ter amor no meio. Mas eu sinceramente espero que o hoje, seja mais correto em relação àqueles que moram nas ruas por falta de opção. Eu espero que cada olhar que se depare com um sem-teto, esteja de alguma forma próximo de fazer a sua parte. É perigoso se aproximar de alguém assim? Na maioria das vezes sim, mas há muitas formas de ajudar. Tive sempre em mente o que queria. Aprendi a ler sozinha juntando palavras, me fascinava quando via alguém lendo próximo a mim, era sempre uma nova descoberta. Agradeço pelo que tenho hoje, ao Senhor do alto que nunca me deixou sozinha, por meus pais que mesmo eu sendo uma menina-grande não hesitaram em me adotar aos 14 anos de idade. ♥

★☾ ✿Gente - Miúda✿

★☾ ✿Gente - Miúda✿
Era uma vez, uma garotinha que se chamava... Bora ler!

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Especialmente especial

Autoria: M.Fernanda
Imagem: Google

Você é especialmente especial Deus...
Ela caminha olhando o Sol que desponta na beira da praia.
O dia parecia refletir o brilho das estrelas naquele Céu que ela admirava, tanto nos dias quanto nas noites, mas naquele momento sua cabecinha precisava reorganizar as ideias do ontem, e aninhar a esperança dos que não aprenderam a viver na paz. Ninguém deveria ser privado do costumeiro riso de todos os dias.
Quem é você? Lhe diz a garota de óculos cor rosa sentada numa toalha toda desenhada de beijinhos.
Ela toda contente lhe responde:
- Me chamo Fernanda, mas pode me chamar de Fernandinha, e você?
A outra menina lhe olha de soslaio e depois de um tempinho responde:
- Diane. Você veio para pedir garota?
- Não, vim ajudar Maria, a moça da faxina.
- E por que não está faxinando com ela?
- Porque ela me disse que eu já havia feito o que meu tamanho podia.
- E o que era? Limpar debaixo das camas? hahaha
- Não, limpar todos os calçados do seu quarto, e você tem um montão assim ó. E abrira bem os braços para aperfeiçoar o modo de dizer que era muitos sapatos.
- E todos bem novinhos, puxa!
- Ah! Pois. São mesmo.
- Pode ir pegar um suco na cozinha?
- Claro!
- Mas você também quer?
Ela deu uma gargalhada e logo em seguida disse:
- Você pensa que o suco é para quem?
- Para mim?
A gargalhada saíra bem forte e única num estrondoso desdém.
- Sua menina boba, é para mim.
Fernandinha foi buscar então o suco e veio bem lentamente para que não sujasse o chão. Enquanto fazia o trajeto cozinha e piscina, ela pensava: como deveria ser muito bom morar num lugar tão bonito assim. Mas se era tão bom assim, por que Diane parecia tão zangada com tudo?
Então ao chegar no seu destino e entregando o suco à outra garota ela pergunta:
- Seu lar é tão aconchegante e bonito, mas por que você parece infeliz?
Não obteve resposta, compreendeu que se a tivesse seria com uma ponta de sal nas palavras, pois quem se cala guarda um conteúdo muito vasto de respostas, e às vezes estas respostas doem no fundo da alma, e por isso se calam para não doer mais.
- Diane?
- Diz.
- Quer conversar do que sente no coração?
- Como assim?
- A Sra. Selma lá da venda do seu Marco diz que quando não sorrimos é porque trazemos uma tristeza gigante por dentro. E eu penso, se ela for tão grande dessa forma quanto ela diz e faz a gente não sorrir, é porque de alguma forma perdemos o nosso riso em algum lugar escuro, e para achar é preciso ser sábio para ir em busca dele de alguma forma, não acha?
- Não estou te entendendo, você é muito, muito estranha, e diz cada coisa.
- Bem, ser estranha eu sei que sou, já ouvi tanto isso que acabou virando adequado para mim, mas eu só queria te dizer que você precisa ser corajosa para entrar lá dentro de você e explorar, e achar o seu riso de volta e trazer ele para seus lábios novamente, porque sorrir é tão maravilhoso e transborda o que sentimos, e ensina o outro a sentir a mesma força também.
- Escuta, eu não quero falar de mim, e se você pergunta tanto, por que não fala um pouco de você? Vai fala!
Fernandinha demora um pouco e depois diz:
- Mas eu não tenho nada de colorido para contar, quero dizer, não sei o que contar que possa te fazer sorrir. Mas posso te contar como é legal onde eu moro. Tudo bem, é mais legal que a sua bonita casa, mas também né? É do lado de fora.
- Do lado de fora? O que quer dizer Fernanda?
- Primeiro eu acordo com o Sol saindo lá do Céu, e ele vem cheio de vários raios brilhantes, e nessa hora eu já sei que o Senhor do alto o mandou mais uma vez ficar colado na parede do mundo para encher os homens da Terra de energia do bem. Depois escuto o barulho das ondas do mar, e elas me fazem perceber como ELE é especial, pois construiu coisas tão belas e não as deixou trancadas para que os homens não tivessem acesso, mas as deixou lá para que cada um perceba que ali mora a alegria, que assim como o Sol e o mar existem todo um resto como a chuva, os pássaros, as flores, o verde imenso das matas, os animais, e que cada dia nós esbarramos com tudo isso, e poder lembrar que o Senhor do alto fez para todos nós é uma dádiva. O que eu não consigo compreender é porque os homens são tão infelizes tendo tanto?
- Talvez seja porque nós não somos capazes de enxergar com a humildade de alguns.
- Então a humildade é como uma lente?
- Talvez.
- Então é uma lente da alma?
- Não sei responder, você faz muitas perguntas e fala demais também.
- É eu sei...
- Posso fazer mais uma pergunta?
Depois de silenciar um tempo Diane responde:
- Pergunta...
- É bom ter pai e mãe né?
- Você não os tem?
- Não aqui comigo.
- Disso eu sei, você veio só com Maria.
- Ah não, quero dizer que nós não nos conhecemos ainda, mas eu tenho.
- Então essa história de bancos de praça e de mar... Você mora nas ruas de verdade?
- Moro e, tomo banho num chafariz, e guardo meus cadernos na igreja.
- Fala sério! Mora na rua?
- É moramos juntas. Moramos num quadro pintado pelo papai do Céu.
Silêncio...
- Fernanda...
- Sim!
- Às vezes acho-os irritadores, mas é bom ter pais sim. Talvez eu é que seja irritante. Sempre exigente e nunca gentil.
- Se eu tivesse pais iria ter uma cama feito a sua, e suco para tomar, mas sabe? Eu não iria querer pedir para ninguém, iria querer ir buscar e abraçar a minha mãe enquanto ela estava preparando o almoço.
- E se seus pais trabalhassem fora, e você os quisesse ver, e só os visse um pouco antes de dormir?
- Ah... Eu iria aproveitar cada pouco com muitos risos e beijos. Porque os pais precisam seguir seu caminho, aquele que poderão enfeitar lá na frente para o seu caminhar ser menos tristonho. Eles devem sentir muito por ter que deixar você sem eles por enquanto. Eu sei que os meus sentem. Mas por hora precisa ser assim. O importante é que os seus estão todos os dias ao seu lado, e quando você sente frio pode correr para abraça-los e se aquecer pertinho de seus corações.
- Eu gosto muito de morar do lado de fora, mas é porque eu precisei me acostumar com o que eu tinha. No entanto eu também iria gostar se um dia, calhasse de morar do lado de dentro. Morar por dentro não impede de ver lá fora.
Nisto, Maria termina a faxina e chama Fernandinha, já é hora de seguir na estrada.
Ela vai até Diane lhe dá um abraço e diz:
- Que sorriso lindo o seu.
- Menina eu não sorri.
- Ah não foi com seus lábios não, foi com o seu coração, ele bateu bem forte e eu senti.
Então meio timidamente Diane sorri e num jeito meio sem jeito fala:
- Conhecer você Fernandinha foi especial.
Fernandinha responde:
- E conhecer você foi especialmente especial.
- Até...
Fernandinha então olha para o Céu e com um sorriso largo pergunta ao Senhor do alto:
- E então amigão, para que lado o cata-vento da vida vai me levar mais tarde?



*** Muitas vezes, não importa a situação, a pouca idade ou o que nos acontece, somos equilibristas de nossos atos, escolhas...
A vida é apenas a corda em que penduramos o relógio. Mesmo que a chuva fina caia ou o Sol brilhante sorria estrondosamente lá fora, precisamos aprender que nada é mais bonito que sorrir com o coração, só assim achamos a solução na corda do relógio da vida.

terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Divino tempo

Texto e imagem:
 M. Fernanda
Diário de vida




A manhã prometia o Céu brilhante, o dia era especial de novo, pensava Fernandinha enquanto corria atrás de um caranguejinho, bem pequenino e arteiro que vira se esconder em um dos buracos na areia. Ela ficava impressionada com tanta agilidade.
Ela sorria ao lembrar o jeitinho dele correr para entrar na sua casinha de ladinho. Ele era tão pequenino. Era uma “criança” como ela. Depois pensou e disse para si mesma: não é criança que diz euzinha, Sr. Tufik disse que é filhote que chama.
Ah é mesmo rsrsr... Então caminhou mais um pouco e sentou-se próximo a uma das “casinhas” do caranguejinho, colocou as mãos no queixo e ficou quietinha enquanto pensava. Depois levantou, comparou seu tamanho, ela também era pequena e tinha vários lugares para dormir. Tinha todos aqueles bancos da praça como cama, também a caixa de papelão...
Mas ao pensar nisso seus olhinhos encheram de água, ela sentia falta de alguém que fosse muito, muito especialmente especial, e que a segurasse pela mão que nem as crianças das praças, das escolas, daquelas que tinham uma casa de verdade com janela e portas, e uma caminha com cobertor e tudo. Não precisava ser uma cama nova não, podia ser no chão, afinal ela não tinha regalias com nada, mas sonhava que dentro da casa tivesse uma mãe e um pai.
O entusiasmo foi tão grande que ela adormeceu e sonhou que andava pela praia com um vestidinho cheio de borboletas desenhadas nele, e cada uma delas voava fora do vestidinho e novamente voltavam, e assim iam felizes diante do grandioso mar.
De repente encontrou uma moça muito bonita, e as borboletinhas voaram todas e fizeram um lindo círculo entre elas duas. A moça a olhava demoradamente e depois disse: guardei você há tanto tempo dentro de mim.
É?
- Sim.
Por que me guardou aí dentro?
- Porque mereci.
Quando merecemos é bom?
- Depende
Do quê?
- Do que se merece e então se toma posse.
O que é posse?
- Capacidade de se ter algo.
Então você me tem?
- Ainda não.
Por que está chorando?
- Porque estou feliz.
Então eu quero que seja sempre feliz, que tenha paz dentro do seu coração.
-Por que?
Porque eu sinto que precisava lhe dizer isso.
A moça se agacha e lhe beija várias vezes a face.
Ela a abraça e aperta muito forte, e depois de ficarem assim por um longo tempo, Fernandinha a olha dentro dos olhos e diz: Sabe? Você tem jeito e cheiro de mãe.
- Você sente assim?
Sinto.
- E sabe por que sente?
Sei...
- Por que?
Porque quando o coração da gente salta muito forte no peito, é porque o Senhor do alto está segurando tão bonito na nossa mão que o coração quer ter mão para segurar também na dele. E isso só acontece porque Ele é amor, e só o amor é capaz de coisas colossais.
- Sim minha pequena, por isso temos a ligação que o bom Pai nos faz sentir. Amor com amor. 
Posso te pedir uma coisa?
Sim!
- Nunca solte a mão do amor está bem?
Está.

A brisa forte e o Sol se aninham para provocar seus efeitos, a menina acorda e olha para si procurando o belo vestido de borboletas, e encontra apenas um blusão rasgado e uma bermuda surrada, suja pelo tempo. Olha para o Céu e agradece ao seu amigão do alto por aquele belo sonho. Levanta sacode a areia do corpo e segue pensando que pode não ter nenhuma mãe ou um pai segurando sua mão, ou um lar para chamar de seu, mas tem a certeza que todos os sonhos que sonhou, todos os dias que passou seu coraçãozinho saltou bem forte. Então todos os dias o Senhor do alto segurava sua mão, e ela amava o Céu, a praia, as pessoas, os bichinhos e o caranguejinho que como ela também sabia, que o Divino tempo é um relógio cheio de sabedoria, e que todo ponteiro que ultrapassa trás um limite, um estímulo, uma dor ou uma alegria. E que se trouxer dor e uma lágrima cair, ela nunca virá sem uma mão que a enxugue da maneira precisa para enxugar, e que na vida não existem desígnios sem riscos. O que precisamos é confiar e ter fé, assim poderemos distinguir num simples sonho a realidade.

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Persistência

 
 
Eu fico imaginando essa menina, se tivesse nascido do jeito certo, tivesse tido a regalia de um berço quentinho, com figuras de borboletas e flores enfeitando o quarto, ou uns brinquedos espalhados no cantinho da cama, onde brincava enquanto mãos quentinhas e amorosas lhe colocavam um novo agasalho.
Eu fico imaginando essa menina, tentando olhar da janela na pontinha dos pés, para ver se conseguia olhar o céu e conversar com Deus, mas era tão pequenina, que apenas chegava com os dedinhos lá bem próximo dela, mas se não pulasse muitas vezes nem conseguiria perceber o azul que enfeitava seus dias cinza naquele lugar. No entanto sua persistência era hercúlea, na quinta saltada, sentava ao chão e se dirigia a Ele sem céu mesmo. Mas não ficava sem dizer o que estava sentindo para o amigão do alto.

Eu fico imaginando quando perguntava sobre o natal, e a faisquinha nos olhos era de um gosto só. Ainda havia o samba alegre no peito, por sentir que o rumo da prosa ia ter pedido novo.

E ela pedia que o papai Noel naquele ano trouxesse pais para a Bia, a Maria, a Suzana e para todas as suas amiguinhas. Mas para ela não precisa ouviu papai do céu? Eu já tenho os meus. Qualquer dia desses eles vêm e me levam para casa tá?

Eu fico imaginando, quando os dias passavam, os natais se repetiam e da janela, ela ainda não conseguia observar nada, era naniquinha, mas já dava para subir na cama e verificar o brilho das estrelas piscando para ela, como se dissessem: menina eles vão vir, não perca a esperança. Ela não perdia, lembrava sempre que a senhora do orfanato lhe dissera. “Ela disse que voltaria para te buscar”. Não queria lembrar-se daquela parte que a moça disse (em 2 dias). Essa ela fazia questão de esquecer.

Eu fico imaginando como a menina chorava bem caladinha e se ouvia apenas um soluço tão baixinho, que se precisavam atinar bem os ouvidos para ouvir.

Mas de tanto pedir por seus amiguinhos, decidiu pedir também para si e para isso não iria esperar o natal. Iria falar com seu amigão do alto também sobre isso durante os dias. E falou, e pediu, e esperou.

Ela disse: Senhor do alto, não pense que não sei do seu trabalho aqui na Terra, sei que é muito pesado cuidar de um mundão vasto assim, mas quando estiver cuidando e pondo as coisas em ordem, descobre dona Helena para mim? Pode plantar no coração dela uma saudade bem grandona da menina que ela deixou aqui. Fala para ela que ninguém trocou o meu nome, ainda é o mesmo, e que eu continuo esperando há quatro anos. Diz também que eu mudei, mas só um pouquinho, meus cabelos cresceram e eu fiquei branca de doer, mas tenho a correntinha que ela deixou no meu pescoço.

Eu fico imaginando na choradeira que foi, quando mais um ano passou e nada! E doía tanto por dentro dela que a menina não sabia mais como massagear o peito, para parar a dor. Olhava em volta, via os pequenos como ela dormindo e se compadecia deles também. Somos todos irmãos de pais diferentes na Terra, mas somos iguais perante o Senhor do alto. Queria que cada um deles tivesse um lar, um pai e uma mãe, mesmo que ela nunca mais pudesse ter.

Eu fico imaginando a felicidade nos olhos dela quando cada um dos seus irmãos de lar, foram adotados, ela olhava da janela com a ajuda de um banquinho, a felicidade deles, e corria de um lado para o outro do quarto, e o sorriso largo fartando-lhe a face. Era sua felicidade também ali. Juntava as mãozinhas numa alegria tão pura.

Eu fico imaginando, como foi difícil aprender a guardar a tristeza numa caixinha dentro do peito, porque as outras pessoas precisavam de alegria. Ela também carecia de gargalhar para não enraizar a tristeza na alma, e foi o que fez. Foi plantar flores e amor no mundo, era sua responsabilidade, ela sentia que era.

Eu fico imaginando, quando levou uma surra de camisa molhada aos 4 anos, porque o lençol de sua cama não deixou a bolinha de gude rolar livremente sobre ela, para constatar que a arrumação estava impecável. Ela correu para o canto do quarto e foi chorar uma dor misturada, dor física com dor na alma. Tão gigante tudo aquilo, que a menina decidiu fugir dali para nunca mais voltar.

Eu fico imaginando, na primeira noite descobrindo um céu sem grades, sem bancos, sem confessionários. Ali ela podia chamar o Senhor do alto, sem receios de a senhora má os ouvir, apenas com o receio de um novato em algo que depara pela primeira vez.

Eu fico imaginando, como a maldade pode ser cíclica, principalmente por força de poder. Os dias vieram como que confusos e maravilhosos. Cheios de descobertas e decepções, mas havia força de vontade para aprender.

Eu fico imaginando como a maldade ganha adeptos, e como às vezes colorir um mundo cinza pode ser melhor em alguns casos. Que Deus proteja sempre a humildade da arrogância. Porque linear, é se movimentar na mesma direção, mude se for egoísta, mude se for mentiroso, mude se for malvado, mude se for invejoso, mude se for ranzinza. Mude, a vida é mudança, mas só conta pontos se for para melhor.

Eu fico imaginando se houvessem mais bondade nesse mundo.
Que tal ser alguém de verdade? Alguém, alguém que se orgulha de ser o que é, de pisar no chão se for essa a sua vontade e sujar de areia os pés. De comer com uma simples colher porque mesmo sabendo manejar o garfo, é mais gostoso sentir o alimento na sua intensidade. Dizer o que pensa com carinho, com delicadeza e não deixar o outro ficar na ilusão de uma falsa imagem.

Eu fico imaginando se eu seria uma dondoca sem respeito por pais que me criaram desde o seu ventre, e tivesse crescido futilmente, vendendo uma beleza externa, e por dentro fosse oca de qualquer predicado, e só de pensar nessa possibilidade dou graças por ter nascido, e ter sido logo deixada num lugar que foi a ponte para eu ser o que sou hoje.

Eu fico imaginando que não acho nada bonito presenciar pais que trabalham demais para fazer confortável a vida de seus diletos filhotes, para quando chegarem à casa cansados, encontrar tudo por fazer. E os privilegiados nem aí, sem se importar com o cansaço deles. Eu fico imaginando, que não saberia querer ser uma tediosa por não achar graça em nada.

Fico imaginando quando a menina se olhou pela primeira vez no espelho, depois de um banho e uma roupa limpinha e cheirosa, e a graxa longe de seu rosto, não sabia que era tão engraçadinha a ponto de tocar lá no espelho, para saber se não era outra que estava ali. E quando sorriu achou a coisa mais estranha do mundo admirar também um sorriso seu, embora nunca lhe faltassem nos lábios para alguém. Estava acostumada a se ver sorrindo no outro.

Eu fico pensando na alegria do seu primeiro dia de aula, e seu caderno improvisado de folhas soltas, que quando foram ao chão no meio de toda aquela molecada, soaram gargalhadas de todos os lado que a deixaram destemperada. Mas a vontade de estar ali era tamanha que juntou todas as folhas uma por uma, e foi tão orgulhosa sentar na sua carteira só dela naquele momento, e ali começou a dançar palavras e juntar os casais para formar amor.

Eu fico pensando como ela respeita cada opinião, cada descaso, cada carinho e cada ofensa como se fossem todas dignas, porque sabe que aquilo que o outro lhe entrega é tudo que ele tem.

Eu fico pensando como é bom não economizar nada que seja de bom para o outro, porque ele precisa de coisas boas por carregar uma cruz que por vezes é muito pesada, mas só ele e Deus é que tem essa própria ciência.

Eu fico pensando que somos construtores de nossa casa interior, e tudo que seja para lhe fazer melhorar é bem vindo.
Então constato: IMAGINAR dói menos agora.
 
 
Maria Fernanda